Também o Verbo teve de aprender, pelo sofrimento, o que a Carta aos Hebreus designa como a obediência pela fé: um novo modo de presença, um novo modo de agir que se identifica mais com o Espírito. De líder carismático de um movimento renovador de Israel, Jesus de Nazaré tornar-se-á o sem rosto, de quem desviámos o olhar, cuja aparência não é agradável, até ser o Corpo Ausente.
De um anúncio espectacular do Reino que está próximo – convertei-vos! – Jesus tornar-se-á o anfitrião de um Banquete no qual apenas dirá “Este é o meu Corpo”, e do qual o Reino será apenas uma certeza de cujo fruto beberá – um movimento de concentração infinita que a física moderna bem conhece, um Reino que já não dependerá nem da conversão de Israel, nem do seu próprio destino como Messias, mas que dependerá apenas de Deus.
E, no final, Jesus será o Noivo Ausente, cuja Ausência instaurará um Espaço, uma Abertura, uma Fecundidade: é o seu Corpo Ausente que expulsa os discípulos do sepulcro, é o seu desaparecimento da vista que expulsa os de Emaús de sua casa, para os reconduzir a Jerusalém. Será uma pura presença segundo o Espírito, Espírito de presença silenciosa, sem um corpo próprio afim de formar um Corpo no Outro; a mecha que mal fumega, a voz que não se levanta na praça. Jesus será Ungido pelo Espírito até à sua morte, para ser divinamente Transfigurado.
Tradicionalmente, a Igreja e a teologia subordinam o Espírito ao Verbo, o carisma à instituição, a ausência à presença, o símbolo à palavra, a fraqueza à força, o silêncio ao anúncio; mas, na Ressurreição, o Verbo tornar-se-á verdadeiramente o Corpo ou o Espaço onde, numa infinita fraqueza, todos encontrarão o seu lugar: exploradores e monges, mestres e discípulos, teólogos e artistas, evangelizadores e os pais de um filho, a estética e o social.
(Imagem: «Deserto-Soidade», de Enrique Mirones, Monasterio de Sobrado)
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