Fundamentos

A cidade dos desejos ardentes

A cidade dos desejos ardentes

Bernardo Gianni | Ed. Paulinas | 152 págs.

A cidade dos desejos ardentes é fruto das meditações orientadas pelo monge italiano Bernardo Gianni no retiro de 2019 da cúria romana, no qual participou o Papa Francisco. Este acontecimento é o cenário que permite agora, ao público português, aceder a uma proposta de aprofundamento espiritual densa de sentido e de beleza. 

Partindo da cidade de Florença – na qual vive o autor, abade de um mosteiro beneditino –, Gianni caminha de mãos dadas com o testemunho de duas personagens célebres da cidade, o político Giorgio La Pira e o poeta Mario Luzi, para saborear a vocação cristã no seio da cidade e da sociedade humanas. Trata-se de uma leitura e de uma vocação em chaves positivas, nas quais se realçam a busca da beleza, do sentido e do mistério das relações como aberturas à presença e ao amor primeiro de Deus na história. Libertando-se do moralismo estéril e de uma religiosidade marcada pela culpa, Gianni desafia o leitor a mergulhar nos sinais divinos que marcam a difícil vida urbana e social: o monge surge, aqui, não com o apelo à fuga do mundo, mas com o convite a traçar, nos ritmos e relações, a sabedoria que brota do Evangelho. Um livro que é uma proposta a cada leitor para, «retirando-se um pouco» (Mc 6, 31) das tarefas e obrigações – que, em excesso, o podem desumanizar –, ingressar num tempo e num espaço de descoberta do divino, no mosteiro da sua própria casa. 

«É-nos dado restituirmos a cada homem e mulher engolidos pelas trevas do pecado, do desespero, da desilusão, da solidão, a beleza da vocação cristã, o carácter coral de uma transfiguração que resgata a nossa vida e lhe dá um alento elevado, de beleza, de alegria, que muitas vezes evocamos como frutos belíssimos que o Senhor dá com abundância ao nosso coração».

«Escutemos o que nos diz Deus no íntimo da alma. Emudeçam os movimentos da nossa carne o ruído inoportuno, emudeça também a nossa irrequieta fantasia, para escutarmos atentamente o que diz o Espírito, a voz que vem do céu. Com efeito, fala continuamente à nossa alma com o Espírito de vida e faz-se voz que nos impele ao ápice do nosso espírito; mas nós, distraídos por outras coisas, não o escutamos» (Juliano de Vezelay, SC 192 – p. 126).

«A vida do monge é feita de confins. Temos esta palavra difícil de captar – “clausura” – que pode ter o sabor de um muro que nos separa dos outros. É um símbolo geográfico, real, de um limite. Temos, depois, o ritmo litúrgico insistente, a que São Bento nos acostuma, e que nos faz descobrir que existem vários segmentos do nosso dia que não estão em nosso poder, uma vez que são ritmados pelo sino que nos apela ao primado do Senhor sobre o tempo e o espaço. E ainda temos a fraternidade, que é uma escola de amor, precisamente através da descoberta dos limites pessoais e dos limites dos irmãos. Porque digo isto? Porque quando funciona, com a graça de Deus, a comunidade monástica torna-se a descoberta de que estamos todos marcados por muitos confins; e que, precisamente por isso, o homem redescobre o desejo de ir além dos confins, o desejo de ampliar, com o auxílio de Deus e com as asas do Espirito Santo, tudo aquilo que aparentemente parecia conduzir ao fechamento em si, à restrição, com a força de um amor que, gradualmente, permite descobrir o todo no fragmento» (p. 83).

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