Fundamentos

As Mulheres nas Comunidades Paulinas

Um excerto de Elena López, professora de Escrituras em Madrid, sobre o papel das mulheres nas comunidades paulinas (porque temos de ir a Espanha para vermos as professoras de teologia escreverem sobre estes temas?)

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«As referências de colaboradoras femininas na missão paulina entrelaçam-se com as referências a personagens masculinas relevantes. O número de mulheres nomeadas nas cartas é bastante inferior que o de varões, tal como é inferior a percentagem de mulheres líderes em relação aos homens que realizam as mesmas funções. No entanto, de tal facto não se pode deduzir simplesmente que esta fosse a realidade histórica. Como sucede com outros testemunhos que vieram à luz em sociedades androcéntricas e patriarcais, as mulheres ficam praticamente ocultas e as suas existências concretas são reconhecíveis apenas de passagem na escrita masculina.

A invocação dos seus nomes, juntamente com aquilo que fizeram a favor da consolidação e extensão do movimento cristão nas suas origens, é a expressão das dificuldades sofridas em conjunto por homens e mulheres, da sua valentia no anúncio do Evangelho e na construção da fraternidade, e são igualmente expressão da ‘alta estima recíproca’, em Cristo, que Paulo e os discípulos/as se tinham.

As comunidades paulinas não têm estruturas uniformes de liderança. Nelas existem muitos colaboradores/as na missão, que realizam tarefas muito diversas: visitam as comunidades para verificar o crescimento da sua fé e animá-las nas suas dificuldades (1 Tes 3,2.6), levam mensagens do apóstolo e cartas (Rom 16,1; 1Cor 4,7; 16,10), informam a Paulo dos problemas comunitários (1 Cor 1,11), supervisionam as igrejas locais, instruem e evangelizam (cf. Rom 16; 1Cor 16,10). Alguns destes homens e mulheres permaneceram como líderes locais, enquanto que outros o foram também itinerantes. Não é possível, no entanto, distinguir bem uns dos outros, e existe uma certa ambiguidade.

A autoridade feminina inscreve-se neste marco, em que a liderança de mulheres se reconhece nos títulos que recebem, tal como nos homens, e que atestam a sua inclusão nas distintas equipas missionárias, para favorecer o enraizamento e a inculturação do Evangelho nas culturas mediterrânicas, e para animar a vida dos grupos cristãos. A comparação dos dados sobre mulheres nestas equipas missionárias (e que temos a sorte de terem sido deixados por Paulo) com as notícias que descrevem a actividade dos colaboradores masculinos, revela que desempenharam uma ‘intensa actividade missionária’ nas suas comunidades locais, nas viagens, através do comércio, e através dos ofícios que desempenharam, e tudo isso apesar das muitas dificuldades e perigos.

Os títulos de ministra, benfeitora, apóstola, colaboradora, irmã, sancionaram e fomentaram a implicação activa e significativa das mulheres no cristianismo, e ofereceram o âmbito de respeitabilidade necessário para viver em sociedades estruturadas e articuladas segunda a honra (prestígio, reconhecimento e estima pública). Algumas crenças, valores e condutas que a sociedade envolvente catalogava de ofensivas e desonrosas eram, naquela altura, louvadas e estimuladas nos grupos paulinos. As críticas sociais transformam-se em felicitações para aquelas mulheres que com a sua inteligência, a sua capacidade para partilhar dos seus bens, o seu tempo e as suas qualidades contribuíram para o crescimento do movimento cristão.

Os títulos representam assim uma palavra visível de autentificação e acreditação destas mulheres que com as suas obras adquiriram o direito a serem socialmente consideradas dentro do seu grupo. Mas, além disso, sendo utilizados pelo Apóstolo, sancionam e legitimam a autoridade e a liderança feminina. De facto, é uma crença firmemente enraizada no mundo antigo que a aprovação e o louvor dado a alguém que possui um alto estatuto ou que goza de grande prestígio incrementa a honra de quem recebe o elogio, o posto ou o reconhecimento das suas acções. As mulheres receberam estes títulos da parte do próprio Apóstolo. Por outro lado, o facto de que sejam conhecidas por mais comunidades além daquelas a quem estariam ligadas (ou porque se movíam entre as distintas comunidades ou eram enviadas com cartas de Paulo, ou porque através das próprias cartas de Paulo que poderíam circular de um lugar para o outro), é um sinal de que o seu prestígio era muito grande, já que a honra cresce na medida em que mais pessoas reconhecem tal prestígio.»

Elena Estévez López, ‘Las Mujeres en los Orígenes Cristianos’, in Rafael Aguirre (org.), ‘Así empezó el Cristianismo’, Estella 2011. Elena López é professora de Sagrada Escritura na Pontifícia Universidad Comillas, em Madrid.

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