Fundamentos

Ao ritmo das Horas: em visita a um Mosteiro Cisterciense

sobrado

Mais do que a «fuga do mundo», o ambiente que se respira no Mosteiro Cisterciense de Santa Maria do Sobrado, na Galiza, é talvez o de um «velar-se do mundo». De facto, entre monges há a perfeita consciência, por exemplo, dos gravíssimos problemas de desemprego que se vivem em Portugal, como em Espanha, e isto não apenas pelas notícias, como pelo testemunho de quem por aqui passa.

«Velar-se do mundo», pelos lugares de clausura e pelas horas de silêncio, significa a consciência de que o mais importante e essencial da vida acontece no silêncio e na clausura, num mundo onde predomina o mediático, onde só é o que é visto e mostrado, onde até a celebração do Lava-Pés acontece com câmaras de filmar, de fotografar e de registar. Os monges não se mostram, não fazem questão de mostrar o que fazem, nem gostam de falar de si: por isso o mundo (inclusive o mundo dos cristãos) muitas vezes não os compreende.

E eles aí estão: gostam de conversar, e conversam com quem os visita, mas não encharcam os ouvidos de quem os escuta; preferem até ser eles a escutar (e quanto poderíamos aprender com esta sabedoria, mesmo no âmbito da chamada «nova evangelização»). Os monges não têm «actividades» ou «programas» planeados para quem os visita, além de proporcionarem o silêncio, a beleza natural do espaço em que vivem e do qual cuidam, e os seus próprios momentos de oração – nos quais convidam todos a participar, mas sempre na condição de «cada um participar do modo que lhe parecer mais útil». A quem os procura, parece que insistem sobretudo na metodologia que eles próprios procuram viver: que cada pessoa tem dentro de si o caminho mais importante, e a voz mais necessária, «voz de um fino silêncio»; só precisa de a procurar, através das ferramentas do silêncio, da leitura, da escuta do outro, e dos ritmos quotidianos.

capilla

O seu ritmo diário de vida é bem menos rígido e exigente do que qualquer horário de trabalho numa moderna empresa – porque, nesta, os horários quase sempre não são respeitados, inundando as horas do dia-a-dia de um stress esgotante, de comunicações e estímulos permanentes. O monge, pelo contrário, sabe quando deve trabalhar, quando deve descansar, e quando deve escutar.

Vemo-los com o seu hábito nos momentos litúrgicos; mas, depois, quando recebem os peregrinos a caminho de Santiago de Compostela, quando vão à vila abastecer-se do que precisam e cumprimentar os vizinhos, ou quando estão na cozinha, a sua roupa é a mais comum possível. É também com essa roupa que recebem os familiares e amigos que os visitam, abraçando-os e beijando-os.

Por fim, a caridade que vivem é talvez uma das mais difíceis e exigentes: oferecer a todos, quem quer que seja, um espaço de acolhimento, onde cada um pode ser quem é, e onde lhe são oferecidos «os instrumentos de fogo, de respiração, e o instrumento difícil do silêncio» (Daniel Faria). Como é vincado pelos monges, o mosteiro não tem uma casa de retiros mas sim uma hospedaria: aqui cada um é hóspede, quer seja crente ou não-crente.

A sua liturgia é simples e sóbria: centrada no essencial, no mistério de Jesus, o Filho, que se faz presente no seu Corpo. É nesta liturgia, em que cada baptizado se sente parte de um Louvor, que melhor se revela a Igreja, melhor até do que em qualquer ajuntamento de multidões. E é neste Louvor que se revela uma Graça, capaz de transformar e perdoar.

Em Sobrado dos Monxes, na Galiza, onde vive o português Carlos Maria Antunes, encontramos uma marca indelével, num mundo cada vez mais em corrida permanente, não se sabe bem para onde. Tal como nós próprios.

One Comment

  1. Jorge Fialho
    Agosto 5, 2016

    Das visitas que fizemos tudo foi bom. Mas a atração principal voltou-se, de fato, para a liturgia, para a sua simplicidade basicamente centrada em Jesus. Na Eucaristia somos transportados à presença invisível Dele pedindo e sentindo que o perdão está presente, convidando-nos a dar as mãos por um mundo melhor.

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